sábado, 21 de janeiro de 2017

Viagem Régua





 Dizem que as coisas saem melhor quando se fazem sem as termos planeado e isso foi o que aconteceu no último fim-de-semana prolongado. Depois de ter lido um artigo que falava da estrada mais bonita do mundo em termos de condução, decidimos ir a Passo de Régua no vale do Douro.
 


 Há cinco anos, tínhamos feito a viagem de comboio desde o Pocinho até ao Porto, mas não descemos até à Régua. Por certo muito recomendável, mas isso é outra viagem! Agora a visão seria diferente
 


Apanhámos a autoestrada até à Guarda num dia ensolarado e claro. Depois da Guarda seguimos pela IP2 até Trancoso, que não podíamos deixar de visitar, mesmo que já tivéssemos estado lá. Almoço e passeio pelos arredores do Castelo, pelos cantos, becos e vielas… Quase não havia ninguém, só as vozes e gargalhadas dos adolescentes que saiam do liceu.  A aldeia estava muito calma.

 



Seguimos pela estrada N226 até Moimenta de Beira e antes de chegar, viramos à direita para Tabuaço na N323. A paisagem era espetacular: árvores de fruto, carvalhos com as folhas a mudar da cor, castanheiros, romãzeiras…  Surpreenderam-me os campos cheios de árvores sem folhas nenhumas, mas só com frutos  cor de laranja. Mais tarde soube que eram dióspiros.




 Assim começamos a descer o vale. Esse foi o primeiro contato com as vinhas, as oliveiras, os socalcos. Embora o sol se estivesse a pôr e não tivessemos a melhor luz, a paisagem já pressagiava o que nos esperava. Como dizia Eugénio de Andrade “o rio estava transformado em sucessivos e extensos espelhos de água”.

  


 É verdade que a Régua tem muitas opções: o teatro, a igreja, o museu do Douro, um passeio pela Beira, visitas às quintas para poder ver como se faz o vinho… No entanto, no dia seguinte continuamos até Mesão Frio. Não havia um destino, só desfrutar da paisagem, dos miradouros, dos trilhos perto das vinhas nas quintas... O outono continuava nas cores das árvores, nas vinhas… mesmo que fosse dezembro! Era um festim para a vista.







Para o almoço escolhemos o Pinhão, na confluência com o rio do mesmo nome e à beira do Douro, depois de percorrer de novo a melhor estrada do mundo. Ao contrário do que aconteceu na tarde anterior, o sol dava agora nos socalcos e embelecia-os. Não se pode abandonar o Pinhão sem visitar a estação com os azulejos que percorrem a vida no vale e o miradouro. Foi a perfeita despedida embora ainda tivéssemos a viagem de volta por São João da Pesqueira, Vila Nova de Foz Côa até Figueira do Castelo Rodrigo.  Mais e mais vinhas, novas quintas que me deram novas ideias para outras viagens.

Inmaculada Montero



 “O que é bonito neste mundo, e anima
É ver que na vindima
De cada sonho
Fica a cepa a sonhar  outra aventura.
E que a doçura
Que não  se prova
Se transfigura
Noutra doçura
Muito mais pura
E muito mais nova”
                                               Miguel Torga





sábado, 14 de janeiro de 2017

“FOLDING SCREEN”. MARTINHO COSTA



No salmantino Domus Artium 2002 –DA2- podemos ver agora e até o 5 fevereiro 2017 uma exposição de pintura do artista português Martinho Costa.  


O pintor nasceu em 1977 em Fátima, e reside e trabalha em Lisboa.  A sua pintura é figurativa, realista, mas é preciso dizer logo que ao mesmo tempo trata-se de uma arte muito analítica e conceptual, em permanente diálogo com a história, e sempre à procura do sentido das imagens na idade da globalização.  


A mostra tem várias partes.  Uma delas é uma série de 48 retratos.  Trata-se duma homenagem ao pintor alemão Gerard Richter que em 1972 apresentou em Venezia um conjunto de pinturas sob o mesmo título.  Foi o Richter quem disse que algumas fotos anónimas na Internet podem ser melhores do que o melhor Cezanne.  Naquela exposição Richter pintou 48 retratos de importantes personagens históricas do século XIX.  Martinho Costa, pelo contrario, apresenta imagens de gente desconhecida, tiradas das redes sociais e da Internet.  Ainda mais, sublinha o facto do anonimato a través da ocultação dos rostos,  retratando desta maneira, paradóxicamente, ninguém. Fatos, chapéus, máscaras.  Atributos sem homem, parafraseando ao Musil.

 
  
 O diario de Robert Stern é outra das séries desta exposição.  Stern é um cidadão de Pensilvania que publica compulsivamente as suas fotografias na web Flickr.  Costa apanha essas fotos e trabalha com elas no meio pictórico, fixando o efémero e transformando o individuo anónimo num motivo universal.  

   A pintura de maior tamanho representa o bosque de Fontainebleau com a estrada que o atravessa e um cartaz de tráfico que o identifica.  Também não é por acaso que o pintor escolhe este motivo.  A Escola de Barbizon, muito perto dali, esteve formada por um conjunto de artistas que, na segunda metade do Século XIX tiraram a pintura dos escritórios levando-a ao ar livre,  começando desta maneira um trabalho que os impresionistas iam convertir numa nova e radical linguagem artística.




Martinho Costa procura a imagem em Google e pinta-a num estilo figurativo não hiper-realista, sem emfatizar o gesto pictórico, e organizando o quadro numa estructura reticular que fala tanto das velhas técnicas pictóricas como pode evocar a construçãao das imagens digitais a partir dos pixeles.  
 

“Todos os días saio por um caminho diferente” é outra das series desta exposição, e nela o pintor retrata o seu escritório, o lugar onde trabalha, e o faz sem se dar importância alguma,  irónicamente, convertindo-o num bodegón múltiple, um conjunto de pinturas por vezes dobradas –“folded”- sobre o chão, um espaço todo ele onde se mistura a arte e a vida com alguma pincelada de humor escatológico.  


 

Finalmente, há quadros que lembram restos de ruinas, quer de um passado muito antigo, quer de um futuro que já está aquí, à maneira dos filmes do Mad Max. 
 



E mais coisas. Vão ver esta exposicão de Martinho Costa, um jovem artista portugus que pinta –pinta!- e muito mais.  Vocés são os espectadores, vejam o que quiserem, e o que não vejam  imaginem a vontade.  


Ignacio Aparicio Pérez-Lucas.


Mais informação:

http://martinho-costa.blogspot.com.es/