Com o tempo, o porto de Manoel de Oliveira passou a ser
o mundo. Os limites da cidade não são os limites da sua obra. Partiu.
Agora, como nunca, jamais saberemos por onde anda, nem para onde foi.
Mas poderemos sempre recordar o título de um dos seus filmes mais
amados: Vou para Casa.
O tempo é uma passagem de tempos. Morreu.
As palavras podem ser cruéis. Partiu. Os sentimentos podem ser
contraditórios. Acabou. Nasceu uma ausência. Floresce a partir de agora
uma saudade. Constrói-se um vazio triste. Combate-o a alegria da
hipótese do outro lado do espelho. O da esperança, o da certeza da
impossibilidade da morte, da impossibilidade da partida, da
impossibilidade da ausência. Há pessoas para quem a morte não será nunca
uma passagem. Não se afastam. Não desaparecem. Não se apagam da
memória. Não há futuro sem o presente que representam e o passado que
souberam construir. Manoel de Oliveira deu esta quinta-feira o último
suspiro. Tinha 106 anos. O seu tempo é um tempo de todos os tempos.
Expresso 2 abril 2015